Audiência Pública na Câmara Municipal de Campo Grande, na manhã desta segunda-feira, dia 6, apontou série de melhorias para aprimorar a Rede de Proteção à Criança e ao Adolescente. Conselheiros tutelares apontaram mudanças necessárias na educação, saúde (com destaque à rede de saúde mental), assistência social, segurança, além da própria estruturação dos Conselhos.
A discussão foi proposta e presidida pela vereadora Luiza Ribeiro, da Comissão Permanente de Proteção dos Direitos da Criança e do Adolescente. Ela citou que ocorreram avanços, como da área de segurança com o plantão no Cepol para atendimento de ocorrências quando encerra o funcionamento da DEPCA (Delegacia Especializada de Proteção à Criança e Adolescente), às 17h30. Entretanto, no debate foi defendido o atendimento específico, voltado às crianças, no período noturno, com a DEPCA 24 horas. A instalação de três novos conselhos tutelares também foi outra melhoria, após longa batalha judicial. “É preciso avançar ainda mais”, citou a vereadora, que visitou os oito conselhos antes da Audiência.
“Vamos tratar e buscar as soluções para cada uma das questões abordadas nesta Audiência”, garantiu a vereadora Luiza Ribeiro. Ela citou que duas reuniões já estão agendadas, com as Secretarias Municipais de Educação e de Assistência Social para tratar de demandas apresentadas. “Queremos que essa Casa seja ambiente de diálogo sincero, ainda mais em temas importantes como esse de atendimento à criança e adolescente”, disse Luiza Ribeiro.
O debate foi secretariado pelo vereador Herculano Borges, presidente da Comissão Permanente de Proteção dos Direitos da Criança e do Adolescente da Casa de Leis. “Cada um, dentro de suas dificuldades, tem se esforçado pelo melhor. Estamos aqui como parceiros, para saber o que acontece na ponta da Rede de Atendimento e queremos ajudar”, disse. Ele citou a importância da Criação do Centro Integrado de Atendimento à Criança e ao Adolescente, como sonho há muito tempo reivindicado. “Vamos acompanhar de perto essa obra do Centro”. O vereador acrescentou que a Comissão vai fazer todos os encaminhamentos das solicitações recebidas.
O debate iniciou com as falas de conselheiras tutelares de Campo Grande apontando as principais dificuldades e sugerindo melhorias. Elas também citaram a importância de esclarecer à sociedade o papel dos Conselhos Tutelares.
A conselheira tutelar Raquel Lazario, da região do Imbirussu, pontuou deficiências na rede de proteção em diferentes áreas: educação, segurança e assistência social, que impactam no trabalho do conselho. “Toda Rede de Proteção enfrenta diversas dificuldades e recaem sobre o Conselho como se fosse único responsável”, afirmou, lembrando que o principal papel é fiscalizar e tutelar direitos das crianças e adolescente.
Ela citou a necessidade, por exemplo, da criança ter a vaga na escola perto de casa, para facilitar a rotina da família, com casos em que a mãe tem que levar as crianças de ônibus em duas escolas diferentes. Um dos pontos destacados foi a urgência em aprimorar a rede de saúde mental, quando a conselheira Raquel citou exemplo de peregrinação que uma mãe enfrentou em busca de atendimento psicológico para o filho. Sobre a segurança, o conhecimento das leis de criança e adolescente também foi ressaltado.
Representando o Conselho Tutelar da Região Central, Ana Claudia Palmeira ressaltou a necessidade de esclarecer o papel do Conselho Tutelar. “O Conselho não é órgão de assistência, de saúde, nem de segurança. Ele tem que zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e adolescente. Nos procuram para resolver falta de vaga em Emei, falta de medicamento, questões de moradias. O que fazemos é cobrar e articular para que direitos sejam garantidos”. Assegurar suporte psicológico dentro das escolas foi um dos pontos destacados, além da presença dos professores de apoio para estudantes com deficiência.
A sobrecarga de atendimento no Conselho Tutelar da Região Norte foi relatada pelas conselheiras Maria Carolina Zamboli e Louisa Higa. Atualmente, 58 mil crianças e adolescentes residem nessa região e cerca de 8 mil estão em situação de vulnerabilidade. Ela fez o comparativo com o Conselho da Região Central, onde existem 15 mil crianças. “É o mesmo tamanho de equipe, mesmo número de conselheiros. Pergunto: qual desses dois conselhos consegue oferecer atendimento mais humanizado e eficaz? Estou aqui porque desejo que essa realidade mude para que todos possamos trabalhar com as mesmas condições e responsabilidades”, afirmou. Maria Carolina e Louisa pedem o reordenamento dos bairros.
Pela região do Prosa, Débora Castro falou sobre o SGDCA (Sistema de Garantia de Direitos de Crianças e Adolescentes). “A estrutura não é nova, mas permanece desconhecida dos próprios atores que a compõem”, afirmou, citando que ainda segue em lugar de invisibilidade e desarticulação. Ela afirmou ainda que o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) surge para romper paradigma. “Não podemos interpretar sem as lentes da proteção integral e a base do SDCGA”, disse.
Representando a região do Bandeira, a conselheira Carol Kalache ressaltou o papel de zelar pelo cumprimento dos direitos das crianças e adolescentes. Ele defende ampliar o debate sobre as estruturas para toda Rede, considerando que Campo Grande já tem quase 1 milhão de habitantes. Falou ainda que mais três conselhos foram criados, porém “órgãos que atendem às demandas ainda não cresceram em estrutura”. A conselheira defende ainda a ampliação das políticas de prevenção.
Já Gislaine Spessoto, do Conselho Sul, citou a possibilidade de criar mais um Centro Integrado de Atendimento à Criança e Adolescente, com a reforma do prédio onde hoje está instalado o Conselho Tutelar Sul, enquanto a unidade não é construída na região do Jardim Imá.
Discussões – O debate contou com representantes da Secretaria Municipal de Educação, de Assistência Social, da Segurança Pública e autoridades de conselhos e órgãos ligados à defesa das crianças e adolescentes. Mãe e pai de vítimas também trouxeram seus depoimentos à Audiência.
Por vídeo, Célia Nahas, Coordenadora-Geral Nacional de Enfrentamento ao Trabalho Infantil da Diretoria de Proteção da Criança e do Adolescente, falou sobre a Rede de Proteção, com a política municipalizada, para ofertar da forma mais acessível e próxima. Ela citou a importância de ter “atendimento continuado a essas crianças”, citando estratégia de monitoramento e estudos de casos.
A defensora pública Neyla Ferreira Mendes destacou a negligência estrutural que resulta em miséria e tragédias familiares. Para a defensora, a falha atinge toda a rede de proteção, incluindo assistência à família, à educação e ao apoio a pais e mães em situação de vulnerabilidade. “O sonho se transforma em tragédia quando não há apoio”, afirmou. Ela acrescenta que conselheiros tutelares e juízes possuem instrumentos para agir preventivamente, mas a falta de estrutura inviabiliza ações eficazes. “Nossa luta é para que os conselhos tutelares tenham condições reais de trabalho e possam resolver os problemas que enfrentam”, concluiu.
O promotor de Justiça Oscar de Almeida Bessa alertou que a violência persiste, lembrando que Mato Grosso do Sul está cinco entre maiores com casos de estupro de vulneráveis. “Em 67,9% dos casos a violência ocorre dentro da casa das vítimas. O lar, que deveria ser de afeto, torna-se palco de dor. Diante dessa realidade, se faz urgente a rede de proteção para coibir essa violência, de forma preparada, capacitada e articulada”.
Nelly Macedo, delegada titular da DEPCA (Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente), ressaltou a necessidade de união para alcançar bons resultados na proteção de crianças e adolescentes. “Do ano passado para cá, dobramos produtividade, nossos atendimentos e depoimentos especiais. Estamos diuturnamente à disposição. Tentamos em vários casos atuar com agilidade e temos tido êxito em solucionar casos. Proponho a união de todos, pois conseguiremos mais para a Rede como um todo”.
Maria Lúcia Oliveira, secretária adjunta da Semed, também salientou a necessidade de união para soluções, alinhando fluxo de informações. Ela ressaltou a questão da evasão escolar como um dos pontos para trabalho em parceria, sugerindo “uma reunião mais específica do Conselho e Semed para alinhar problemas partilhados”.
O vereador Wilson Lands parabenizou a iniciativa da Audiência, citando que os conselheiros precisam urgentemente serem ouvidos e terem demandas atendidas. Ele se colocou a disposição para ajudar na busca por “investimento em infraestrutura, capacitação, ampliação da equipe e fortalecimento da rede de proteção”
Adriano Ferreira Vargas, presidente da Associação dos Conselheiros Tutelares de Mato Grosso do Sul, relembrou crimes graves que ocorreram em Campo Grande. “Tivemos avanços com os novos conselheiros tutelares, mas ainda não temos o Centro Integrado”. A Depca funcionando 24 horas, não apenas em anexo do Cepol durante o plantão, é outra demanda. Ele citou ainda a necessidade de estruturar melhor os Conselhos, além da ampliação de Creas (Centro de Referência Especializado de Assistência Social).