Audiência Pública na Câmara Municipal de Campo Grande, na manhã desta quarta-feira, dia 6, iniciou com o depoimento emocionados de mães e avós de crianças com deficiência, falando das suas lutas por oportunidade de emprego, para conciliar esse trabalho com os cuidados e até mesmo para garantir direitos básicos. O debate, proposto pelo vereador Professor Juari, presidente da Comissão Permanente de Educação e Desporto, abordou as perspectivas e os desafios enfrentados pelas mães atípicas para inserção no mercado de trabalho.
Com base nas sugestões apresentadas pelos participantes, encaminhamentos foram apresentados pelo vereador Professor Juari, ao final da Audiência, com objetivo de aprimorar ou até criar novas políticas voltadas para as mães atípicas. Na lista constam: criar programa de empregos com carga de horário flexível e reduzida; oferta de cursos de graduação e profissionalizantes para as mães atípicas; inclusão de percentual de 5% no Primt (Programa de Inclusão no Mercado de Trabalho), da Prefeitura; certificado e incentivo fiscal para empresas contratarem mães atípicas; implementar a rede Cuidar de Quem Cuida, como ação do Executivo Municipal; cotas em concurso para mães atípicas; reserva de vagas de estágio para pessoas com deficiência e encaminhamento à bancada federal como proposta de alterações na CLT para as mães terem mais dias de folgas para consultas.
“Essa Audiência é só o início, vamos fazer os encaminhamentos e repassar para todos que participaram para que possam acompanhar e vamos cobrar as autoridades pela execução”, afirmou o vereador Professor Juari. A proposta relacionada ao Primt, por exemplo, deve ser feita por emenda de autoria do vereador no Projeto de Lei 11.945/25, do Executivo, que tramita na Casa de Leis propondo algumas alterações no Programa. A proposta ainda será colocada em discussão e votação no Plenário.
O Promotor de Justiça e Coordenador do Programa MP TEA, Paulo Roberto Gonçalves Ishikawa, destacou que o Ministério Público Estadual também solicitou à prefeitura essa reserva de vagas na lei do Primt. Ele falou ainda do Programa do MP TEA que faz esse acolhimento dos servidores e membros que têm alguma deficiência ou cuidam de alguém nessa condição.
João Henrique Bezerra, diretor da Funsat (Fundação Social do Trabalho), falou da necessidade de cuidado com esse público e também com as pessoas com deficiência. “Temos hoje dois guichês, duas pessoas capacitadas para fazer busca ativa de vagas para inserção no mercado de trabalho”, afirmou.
Atualmente, 70% das mães atípicas deixam o mercado de trabalho para cuidar dos filhos, pontuou o defensor público Bruno Louzada. Ele lembrou que hoje existe um selo para as melhores empresas para se trabalhar, não têm políticas para mães atípicas. “Há necessidade de flexibilização, adaptação do horário de trabalho, incentivo e apoio psicológico”, relatou.
O deputado estadual Pedro Caravina comprometeu-se em acolher os encaminhamentos da Audiência Pública para transformá-los em políticas a nível estadual, com projetos na Assembleia Legislativa. “A inserção no mercado é um assunto de muita relevância. São muitas as dificuldades em conciliar os atendimentos da criança e o mercado de trabalho. Precisamos avançar por redução de jornada, home office”, afirmou.
Relatos
As mães de pessoas com deficiência relataram as dificuldades no dia a dia. Muitas precisam deixar a carreira de lado e não conseguem viver apenas com os auxílios. “O sentimento é de invisibilidade, de anulação da própria vida. Para que ele exista, você tem que se apagar, e muito. E a primeira coisa que morre é a vida profissional”, relatou Lili Daiane Ricaldi, presidente da Comissão de Mães Atípicas do Mato Grosso do Sul. Ela abordou ainda a dificuldade com os outros filhos, que acabam ficando sem momentos de lazer ou cuidados oferecidos pela mãe, além do fato de a maioria não contar com rede de apoio. “A gente não quer viver de benefício, mas é um dinheiro certo que vem todo mês para comprar fralda, remédio e atender as necessidades dos nossos filhos”.
A jornalista Karen Andrielly, que tem o Podcast Diário da Mãe Atípica, falou que há muitos projetos relacionados ao empreendedorismo, mas relatou as dificuldades enfrentadas na prática. “A gente não sabe o dia que criança vai entrar em crise. Como se comprometer a entregar docinho se a criança pode estar internada?”, exemplificou. Ela falou ainda que os recursos do auxílio são insuficientes para pagar o básico das crianças. “Quando falamos de inserir falamos de autonomia para oferecer melhor o acolhimento”, afirmou, pedindo mais políticas para abraçar essas mães.
Emocionada, Rosimari Rodrigues, mãe de uma menina com paralisia cerebral e de um menino autista, falou dos cuidados especiais que exigem muito das mães física e emocionalmente. “Sempre fui manicure, trabalho há 15 anos. Foi importante ter essa profissão antes do diagnóstico, porque consegui trazer a clientela para dentro de casa. Elas me acolheram, me olharam com muito amor”, contou. Mesmo assim, são muitas dificuldades. Há noites em que ela precisa acordar até seis vezes para aspiração da traqueostomia da filha. “O que adoece uma mãe atípica não é o fato de ele ser diagnosticado. Vou amar com todos os defeitos e qualidades, mas precisamos ser acolhidos e vistos de maneira diferente”, disse.
O vereador Wilson Lans, que secretariou a Audiência, ressaltou que “vamos continuar buscando formular leis, projetos e parcerias para avançar neste tema para que as mães atípicas parem de tirar do salário para comprar insumos para os seus filhos, luta que estamos engajados para resolver”.
Já o vereador Maicon Nogueira sugeriu que os atuais programas sejam mais inclusivos, a exemplo das vagas de estágio. Ele sugeriu, por exemplo, a criação de cotas para pessoas com deficiência no Instituto Mirim, além de outras instituições que encaminham estagiários para o mercado de trabalho. “Precisamos fazer com que o poder público faça sua função social”, disse.