Banco Central desiste de regulamentar Pix Parcelado

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(Foto: Bruno Peres/Agência Brasil)

Decisão mantém modalidade sem padronização e acende alerta sobre risco de endividamento

Após meses de expectativa e sucessivos adiamentos, o Banco Central (BC) decidiu abandonar a criação de regras específicas para o Pix Parcelado. A decisão foi comunicada nesta quinta-feira (4), em Brasília, durante reunião do Fórum Pix — comitê que reúne cerca de 300 representantes do sistema financeiro e da sociedade civil. Além de recuar da regulamentação, o BC proibiu instituições financeiras de utilizarem o nome “Pix Parcelado”, embora siga permitido o uso de expressões semelhantes, como “Pix no crédito” e “Parcele no Pix”.

A regulamentação, inicialmente prevista para setembro, foi adiada para outubro e depois para novembro, mas nunca saiu do papel. A modalidade funciona como uma linha de crédito com juros oferecida pelos bancos e já é amplamente utilizada, o que motivou discussões sobre maior transparência e proteção ao consumidor.

Falta de padronização e risco de endividamento

O Pix parcelado permite realizar um pagamento instantâneo com recebimento imediato pelo comerciante, enquanto o cliente assume um financiamento com juros. Sem regras unificadas, cada banco define taxas, prazos, forma de cobrança e como o produto é apresentado ao usuário.

Apesar de nomes que sugerem semelhança com o parcelamento do cartão, a modalidade é, na prática, um empréstimo que já começa a cobrar juros no ato da contratação. Hoje, as taxas médias giram em torno de 5% ao mês, e o Custo Efetivo Total (CET) pode chegar a 8% mensais. Em muitos casos, custos e detalhes sobre atrasos só aparecem na etapa final do processo, e a cobrança das parcelas costuma ocorrer na fatura do cartão.

Especialistas alertam que a ausência de padronização aumenta a dificuldade de comparação entre bancos e pode induzir contratações inadequadas, ampliando o risco de superendividamento.

Idec critica decisão e fala em “desordem regulatória”

A decisão do BC foi duramente criticada pelo Instituto de Defesa de Consumidores (Idec), que participou da reunião. Em nota, a entidade classificou como “inaceitável” a desistência da regulação, afirmando que ela gera um ambiente de “desordem regulatória” e abre espaço para abusos.

Para o Idec, a mudança de nome é apenas cosmética. “O consumidor continuará exposto a produtos de crédito heterogêneos, sem transparência mínima, sem salvaguardas obrigatórias e sem previsibilidade sobre juros ou procedimentos de cobrança”, afirmou.

A entidade também destacou que a forte confiança associada à marca Pix pode induzir decisões impulsivas. O Brasil vive um cenário de alto endividamento, e a modalidade, segundo o Idec, pode agravar esse quadro ao misturar pagamento e crédito sem clareza dos riscos.

“O Pix nasceu para democratizar pagamentos. Transformá-lo em porta de entrada para crédito desregulado coloca essa conquista em risco”, alertou a instituição, que pretende continuar pressionando por padronização e garantias ao consumidor.

Fiscalização incerta

Apesar de vetar o uso formal das marcas “Pix Parcelado” e “Pix Crédito”, o Banco Central não esclareceu como será a fiscalização. Representantes da autarquia afirmaram apenas que acompanharão o desenvolvimento das soluções oferecidas pelos bancos, sem impor padrões específicos.

Para entidades de defesa do consumidor, essa postura pode levar a um cenário em que produtos semelhantes funcionem de formas completamente distintas entre instituições, tornando mais difícil a comparação e elevando o risco de contratações inadequadas.

Impasse entre BC e bancos

Nos últimos meses, havia expectativa de que o BC publicasse regras obrigatórias, como a apresentação clara de juros, IOF, critérios de cobrança, forma de repasse e informações padronizadas. Os adiamentos refletiam divergências entre o Banco Central e instituições financeiras, que pediam ajustes na proposta.

A Febraban (Federação Brasileira de Bancos) declarou ser favorável à existência de normas, mas negou ter pressionado pela suspensão da regulação. Disse, no entanto, que solicitou mudanças no texto e alegou que não havia urgência para publicação.

Com a desistência oficial, permanece um vazio regulatório para uma modalidade já difundida no mercado e associada a uma das marcas mais fortes do sistema financeiro brasileiro.