Feminicídios já chegam a 39 casos, número maior que o dos dois anos anteriores
Em menos de um mês, Mato Grosso do Sul atravessou uma marca histórica e preocupante: 2025 já é o ano com mais registros de violência doméstica contra mulheres desde o início da série histórica, em 2015. O estado ultrapassou 21,5 mil ocorrências, segundo dados atualizados do Monitor da Violência contra a Mulher, do Poder Judiciário sul-mato-grossense.
Até três semanas atrás, o cenário ainda colocava 2025 como o terceiro ano mais violento, atrás apenas de 2023 e 2024. Mas a curva seguiu em alta. Em apenas 21 dias, cerca de 1,4 mil novos casos foram registrados, elevando o total para 21.514 relatos e levando o ano ao topo do ranking negativo.
A concentração dos casos revela um padrão já conhecido. Campo Grande responde por mais de um terço das ocorrências, com 7.645 registros, o equivalente a 35,54% do total estadual. Na sequência aparecem Dourados, com 1.845 casos (8,58%), e Três Lagoas, com 1.052 (4,89%).
A maioria das agressões acontece dentro de casa. Dos mais de 21,5 mil registros em 2025, 15.673 ocorreram em residências. Os demais se dividiram entre vias urbanas, áreas rurais, estabelecimentos comerciais, internet, unidades de saúde, órgãos públicos, locais públicos e instituições de ensino.
Quando analisada a relação entre agressor e vítima, os dados reforçam o perfil predominante da violência doméstica: o cônjuge é o principal autor, com 3.533 ocorrências envolvendo parceiros com vínculo matrimonial. Especialistas alertam que os números refletem apenas os casos que chegam aos canais oficiais — e que a subnotificação ainda é um dos maiores desafios no enfrentamento ao problema.
O recorte etário mostra que mulheres entre 30 e 59 anos são as principais vítimas, com 11.847 registros. Em seguida estão as jovens de 18 a 29 anos (7.062), idosas acima dos 60 anos (1.425), adolescentes entre 12 e 17 anos (956) e até crianças, com 223 casos envolvendo meninas de até 11 anos. Os dados foram atualizados até 23h59 de sexta-feira (26).
Feminicídios em alta
O aumento da violência doméstica tem reflexo direto no número de mortes. Mato Grosso do Sul já contabiliza 39 feminicídios em 2025, superando os totais registrados em 2023 (30) e 2024 (35).
O caso mais recente ocorreu em 14 de dezembro, em Ribas do Rio Pardo, quando Aline Barreto da Silva, de 33 anos, foi morta pelo marido. Ela chegou a ser socorrida, mas não resistiu aos ferimentos. O suspeito foi preso em flagrante.
Medidas protetivas
Previstas na Lei Maria da Penha, as medidas protetivas seguem como um dos principais instrumentos de proteção às vítimas. Até o fim de novembro, foram 14.532 pedidos, dos quais 12.885 foram concedidos — uma taxa de 88,67%. A média mensal gira em torno de 1,3 mil solicitações.
Dados da Defensoria Pública de MS apontam crescimento expressivo na procura: os pedidos feitos por meio do órgão saltaram de 1.536 em 2024 para 3.806 em 2025. Segundo a defensora pública Kricilaine Oksman, o perfil das mulheres atendidas revela a sobreposição de desigualdades sociais, raciais e econômicas, que ampliam a vulnerabilidade à violência.
O Ministério Público de Mato Grosso do Sul avalia que o aumento dos registros também reflete o avanço das campanhas de conscientização, mas alerta que o medo, a vergonha e a ausência de rede de apoio ainda impedem muitas vítimas de denunciar. “A ideia de que a violência doméstica é um problema do casal ainda persiste e contribui para o silêncio”, destacou o órgão.
Onde buscar ajuda
A Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180 funciona 24 horas por dia, com ligação gratuita, para orientação, registro e encaminhamento de denúncias. O serviço também está disponível por WhatsApp, no número (61) 9610-0180, inclusive para brasileiras que vivem no exterior.
Em situações de emergência, a orientação é acionar a Polícia Militar pelo 190.
Dados nacionais mostram que, entre janeiro e novembro, 2.010 mulheres de Mato Grosso do Sul denunciaram casos pelo Ligue 180 — o equivalente a uma denúncia a cada quatro horas no estado. Em todo o país, foram 138,9 mil denúncias no período, a maioria registrada pela própria vítima.




















