A Câmara Municipal de Campo Grande recebeu, na manhã desta segunda-feira, dia 17, as Religiões de Matriz Africana, para discutir sobre direitos, respeito, saberes e resistência. O combate ao racismo religioso e a efetivação de políticas públicas também foram discutidos. Lideranças religiosas, pesquisadores da área, Ministério Público Estadual e representantes de movimentos sociais estiveram presentes no debate.
O debate foi proposto pela vereadora Luiza Ribeiro, presidente da Comissão Permanente de Políticas e Direitos das Mulheres, de Cidadania e de Direitos Humanos. “Os povos de religiões de Matriz Africana sofrem muita exclusão, muito preconceito e onde tem a exclusão e o preconceito aparece a violência, a redução dos direitos. Essa Audiência Pública é muito necessária no âmbito dos direitos humanos para que a gente possa ajudar a cidade a entender que os povos de religião de matriz africana precisam de respeito, de garantia de direitos e podem contribuir muito com a cidade”, afirmou.
Ela exemplificou que há crianças nas escolas públicas de Campo Grande que sofrem preconceito por conta de religião, além de casas ilê, templos e terreiros que sofrem ataques por causa de intolerância religiosa ou ainda recusa de profissionais em razão de discriminação religiosa. “Tudo isso precisa encontrar aqui na Câmara dos Vereadores espaço para discussão e para encaminhamento de soluções que afastem toda forma de preconceito e com isso faça com que os direitos das pessoas de religião de Matriz Africana sejam efetivamente respeitados”, afirmou a vereadora Luiza Ribeiro.
A criação de uma delegacia especializada e preservação da Praça do Preto Velho foram algumas das demandas. Outra proposta é a criação do Conselho Municipal das Religiões de Matriz Africana, como pontuou Bàbálórìṣà Augusto de Lógunẹ̀dẹ, presidente do Instituto Yalodê. “Existe muita intolerância religiosa, descaso com o meio ambiente, perseguição e muitos direitos são negados ao povo de Axé. Então, uma Audiência Pública como essa é importantíssima para que os direitos do povo de Axé sejam garantidos. É um espaço que está sendo tomado, que está sendo buscado. O povo de Axé é um povo que luta muito para poder estar onde está e sobreviver até os dias atuais”, afirmou.
O presidente da Federação dos Cultos Afrobrasileiro e Ameríndios de Mato Grosso do Sul (Fecams), Bàbálórìṣà Gaeta de Òṣàlùfọ̀n, informou que, “infelizmente, a religião, os povos tradicionais de Matriz Africana e a comunidade de terreiro são povos muito perseguidos, que sofrem com uma intolerância muito forte”. Ele informou que, neste ano, já há um índice alto de situações de opressão. “As pessoas têm que entender que hoje isso é um crime religioso. E aí a gente precisa realmente discutir os direitos. Esses direitos são garantidos pela Constituição Federal e várias legislações federais e estaduais. Então, precisamos mostrar como o povo de Axé tem um comportamento. Estamos preocupados com todos os sentidos, onde envolve educação, saúde, saneamento, a natureza”, afirmou. Ele citou também a importância de uma delegacia especializada para que os crimes religiosos sejam devidamente registrados.
Bàbálórìsà Deá Odé, presidente da Federação das Religiões dos Povos de Terreiros do MS e Federação Ajô Nilê, agradeceu a Casa de Leis pela oportunidade de externarem as necessidades, afirmando os direitos e cobrando os deveres. “A nossa religião está hoje em grande ascensão. Eu poderia dizer que está em moda diante dos artistas, diante dos cantores, dos atores que assumem a nossa religião. Isso deu uma adesão enorme. E diante dessa situação é necessário sim nós estarmos aqui cobrando e orientando o nosso povo. Nós estamos buscando cobrar os nossos direitos que, muitas vezes, não são divulgados”, afirmou. Ele citou que ainda há essa necessidade de discutir igualdade, diante dos casos de intolerância e perseguição.
O promotor de Justiça Douglas Silva Teixeira, do Núcleo de Promoção da Igualdade Étnico- Racial, ressaltou a importância da Audiência para a formulação de políticas públicas específicas. “Existe uma parte histórica envolvendo as religiões de matriz africana, que deve ser preservada, mas ainda existe uma certa intolerância com essas religiões e o que não se mostra correto”. Ele ressaltou que as pessoas têm liberdade para praticarem a religião que entenderem mais convenientes. O promotor acrescentou que em casos de intolerância ou preconceito o MPE pode ser acionado, tanto na Capital ou nas promotorias do interior do Estado. A promotora de Justiça Paula Volpe também esteve presente e passou informações sobre o encaminhamento de denúncias, que já resultaram em ações e condenações no Estado, além de várias medidas para prevenir os casos de discriminação.
Por 17 anos, o professor Antônio Lino Rodrigues de Sá pesquisou as religiões de Matriz Africana na UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), em especial o Candomblé. Ele trazia informações sobre a religião para estudantes de diferentes cursos, em especial Educação e História. “Esse debate de hoje é histórico, é um espaço que tinha necessidade de se ter, para termos esses encaminhamentos. E dentro dessa proposta, eu acredito que vai sinalizar para uma organização e um apoio às pessoas que são da religião de Matriz Africana”.
O pedido de tombamento da Praça do Preto Velho, bem como investimentos para preservá-la, foi uma das demandas trazidas à Câmara por José Luiz Mendes, representante provisório da Associação da Umbanda de Mato Grosso do Sul. “Vejo com muita tristeza o descaso com o único espaço que temos”, disse, ao lembrar de emenda destinada ainda não aplicada no local.











