Brasil reage a tarifaço de Trump e reforça aliança com os Brics

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Trump chegou a anunciar tarifa extra de 10% a nações que se alinhassem a políticas dos Brics (Foto: Alan Santos /PR)

Enquanto tenta destravar o diálogo com os Estados Unidos, o governo brasileiro analisa estratégias para reverter o impacto do tarifaço anunciado pelo presidente norte-americano Donald Trump. O episódio reacende discussões sobre o papel do Brasil nos Brics — bloco econômico que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul — e evidencia um possível realinhamento na geopolítica internacional.

Mesmo diante do ceticismo de Trump em relação a instituições multilaterais e da ameaça de sobretaxar países que adotem “políticas antiamericanas dos Brics”, membros do governo brasileiro veem a crise como uma oportunidade de ampliar a integração com os parceiros do bloco. A análise foi reforçada por Celso Amorim, assessor de Relações Exteriores da Presidência da República, em entrevista recente ao Financial Times, ao destacar que os Brics “não têm caráter ideológico” e defendem a ordem multilateral.

A inquietação da Casa Branca, porém, aumentou com a proposta liderada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva de criação de uma moeda comercial comum entre os Brics — uma forma de reduzir a dependência do dólar nas transações internacionais. Desde 2023, Trump tem reagido duramente à ideia, e neste mês anunciou tarifa extra de 10% para países que aderirem a essa iniciativa.

Ameaças e oportunidades

Para a especialista em relações internacionais Natali Hoff, a iniciativa dos Brics desafia diretamente a hegemonia dos Estados Unidos. “A fala do Trump evidencia que os EUA não vão aceitar passivamente uma mudança no centro de gravidade do sistema internacional”, afirmou. Segundo ela, a adoção de uma nova moeda poderia representar mais autonomia econômica para os países do bloco, ainda que envolva tensões políticas significativas.

Já o analista Guilherme Frizzera destaca que o endurecimento norte-americano representa uma ruptura com o modelo liberal construído no pós-guerra. “Estamos diante de uma reconfiguração da ordem internacional, não por escolha dos EUA, mas como reação à sua postura confrontacional e ao enfraquecimento das instituições multilaterais”, disse.

Crise nas instituições

Esse novo cenário tem abalado estruturas históricas, como a Organização Mundial do Comércio (OMC). Os Estados Unidos vêm bloqueando nomeações para o Órgão de Apelação da entidade, minando a eficácia do sistema de resolução de disputas. Recentemente, o Brasil questionou formalmente na OMC o uso de tarifas como mecanismo de pressão — sem, no entanto, citar diretamente os EUA.

Resposta brasileira

Em meio às tensões, Lula ironizou a reação de Trump às movimentações do Sul Global. “Possivelmente, o Trump tenha ficado preocupado com a reunião dos Brics”, afirmou o presidente, em entrevista à jornalista Christina Lemos, do Jornal da RECORD. Ele defendeu uma política externa baseada em diálogo, soberania e equilíbrio — princípios que, segundo ele, contrastam com a estratégia americana.

Com reuniões diplomáticas e técnicas marcadas para os próximos dias, o governo brasileiro tenta evitar a concretização das tarifas e, ao mesmo tempo, costura alianças mais sólidas com países que compartilham a visão de um mundo multipolar. A semana promete ser decisiva para os rumos da política comercial brasileira e para o futuro das relações com os EUA.