Dor de cabeça, enjoo e cansaço: o que está por trás da ressaca

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( Foto: Pavel Danilyuk/Pexels)

Genética, tipo de bebida e hidratação influenciam a intensidade dos sintomas

Dor de cabeça, boca seca, náusea, mal-estar geral e a sensação de “corpo travado”. A ressaca é um efeito conhecido do consumo de álcool, mas nem sempre previsível: pode ser leve para quem bebeu mais e intensa para quem exagerou pouco. Especialistas explicam que o quadro é resultado de uma combinação de processos inflamatórios, metabólicos e neurológicos no organismo.

Segundo a nutricionista Patricia Neri Cavalcanti, do Hospital Samaritano Higienópolis, da Rede Américas, a ressaca começa no fígado. É ali que o etanol é transformado em acetaldeído, uma substância tóxica que provoca parte do mal-estar. Além disso, o álcool tem efeito desidratante, o que explica sintomas como dor de cabeça, boca seca, fadiga e fraqueza.

“Mesmo desidratações leves já são suficientes para causar esses sintomas”, afirma a nutricionista. O álcool também irrita o estômago e o intestino, aumenta a acidez e retarda o esvaziamento gástrico, favorecendo náuseas, enjoo e desconforto abdominal.

Por que algumas ressacas são piores?

A intensidade da ressaca varia de pessoa para pessoa. Fatores genéticos influenciam a produção das enzimas responsáveis por metabolizar o álcool. Pessoas com alterações hepáticas, inflamação no fígado ou que fazem uso regular de medicamentos tendem a metabolizar o álcool mais lentamente.

“Cada dose impõe um estresse adicional a um órgão que já pode estar fragilizado”, explica Patricia. Por isso, duas pessoas que consomem a mesma quantidade de bebida podem ter reações muito diferentes no dia seguinte.

O tipo de bebida também interfere. Isso ocorre por causa dos congêneres — substâncias formadas durante a fermentação e o envelhecimento, como metanol em pequenas quantidades, taninos, histaminas e sulfatos. Esses compostos podem intensificar inflamação, dor de cabeça e irritação gastrointestinal.

De forma geral, bebidas como vinho tinto, uísque e conhaque costumam causar mais ressaca; a cerveja aparece em nível intermediário; e vodca e gim, por serem mais “puras”, tendem a provocar menos sintomas. Ainda assim, a quantidade ingerida e a sensibilidade individual continuam sendo os principais fatores.

Quanto tempo o corpo leva para se recuperar?

Não há uma resposta única. O tempo de recuperação depende da quantidade e do tipo de bebida, da genética, do estado de saúde, da hidratação, da alimentação e da qualidade do sono — que costuma piorar após o consumo de álcool.

Em média, o fígado metaboliza de meia a uma dose de álcool por hora. No entanto, os efeitos inflamatórios e a piora do sono podem se estender por 12 a 24 horas. Mesmo depois de o álcool ser eliminado do organismo, o cansaço pode durar o dia inteiro.

Quando a ressaca vira sinal de alerta?

Alguns sintomas exigem atenção médica, como vômitos persistentes ou com sangue, confusão mental, dor de cabeça intensa, palpitações, dor abdominal forte, diarreia com sangue, sudorese excessiva ou tremores. Nesses casos, a orientação é procurar atendimento de saúde.

O que ajuda — e o que não resolve

Beber água ao acordar ajuda a aliviar sintomas ligados à desidratação, mas não reduz a inflamação nem acelera a metabolização do álcool. Em quadros mais intensos, água de coco, isotônicos ou soro caseiro podem ser mais eficazes, por reporem eletrólitos como sódio, potássio e magnésio.

O álcool também prejudica a absorção de vitaminas do complexo B e aumenta a perda de minerais. Por isso, alimentos leves e nutritivos no dia seguinte — como frutas ricas em água, vegetais, caldos e proteínas magras — auxiliam na recuperação.

Comer antes de beber também faz diferença. Alimentos com proteínas e gorduras retardam a absorção do álcool e ajudam a manter a glicemia mais estável.

E os remédios?

O neurologista Diogo Haddad, do Hospital Nove de Julho, alerta que o paracetamol deve ser evitado após consumo excessivo de álcool, pois ambos são metabolizados pelo fígado, aumentando o risco de toxicidade hepática. Anti-inflamatórios também exigem cautela, já que podem irritar ainda mais o estômago e sobrecarregar os rins em pessoas desidratadas.

“Automedicação logo após beber não é uma boa prática. O mais seguro é hidratar, repousar e aguardar o organismo eliminar o álcool”, afirma o médico.

Especialistas também alertam que fórmulas “anti-ressaca”, chás e suplementos vendidos na internet não têm comprovação científica consistente. A ressaca é multifatorial e não existe substância capaz de neutralizar imediatamente os efeitos tóxicos do álcool.

“A melhor estratégia continua sendo evitar excessos, alternar bebidas alcoólicas com água, dormir bem e manter uma alimentação adequada”, resume Patricia.