Economistas afirmaram que aumento de 0,25 ponto percentual da Selic deve tornar crédito mais caro e aumentar inadimplência
O Banco Central anunciou na semana passada a primeira alta em dois anos da taxa básica de juros, que passou de 10,5% para 10,75% ao ano. O aumento é o primeiro do terceiro mandato do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e veio alinhado às expectativas do mercado financeiro, que projetava essa elevação. Economistas explicam que a alta da Selic deve ser sentida no curto e médio prazo e vai impactar o mercado de crédito e o dia a dia da população.
Entre outros efeitos, o aumento de 0,25 ponto percentual dos juros deve reduzir o consumo e o poder de compra dos brasileiros, além de tornar o crédito mais caro, o que pode gerar uma maior inadimplência.
A leitura dos especialistas é de que a economia em geral tende a desacelerar com o aumento dos custos de crédito, o que pode impactar a geração de empregos e os investimentos. Segundo José Luiz Pagnussat, mestre em economia pela UnB (Universidade de Brasília), juros mais altos reduzem a demanda econômica e, consequentemente, o crescimento e o emprego.
“O crescimento da economia (PIB) é determinado pelo crescimento da demanda. Os bons resultados do PIB, puxados pelo crescimento do consumo das famílias (dado o aumento da massa salarial com mais empregos e salário médio maior), além do crescimento da demanda dos empresários (investimentos – compra de máquinas, equipamentos) preocuparam o BC”, afirmou.
Crédito mais caro
Para Hugo Garbe, doutor em economia e professor da Universidade Mackenzie, um dos efeitos da alta da Selic é o encarecimento do crédito. Segundo ele, o crédito mais caro afeta o consumo, já que as compras parceladas e financiamentos ficam menos acessíveis.
“O primeiro impacto direto será no custo do crédito. Com a taxa de juros mais alta, os bancos e instituições financeiras ajustam suas taxas para empréstimos pessoais, financiamentos e até o rotativo do cartão de crédito. Isso significa que consumidores que dependem de crédito terão que pagar mais pelos mesmos empréstimos”, afirmou.
Inadimplência maior
Garbe avalia que, à medida que o custo do crédito sobe, é esperado um aumento na inadimplência. “Muitos consumidores já endividados terão mais dificuldade em pagar seus compromissos, resultando em um número maior de calotes.
“Segundo especialistas, os primeiros sinais de maior inadimplência devem aparecer no setor de crédito pessoal e no rotativo do cartão de crédito, onde as taxas são tradicionalmente mais elevadas”, explicou.
Perda do poder de compra
Para Newton Marques, economista do Corecon-DF (Conselho Regional de Economia do Distrito Federal), a perda do poder de compra é outro impacto do aumento dos juros no dia a dia do brasileiro, e tem efeito imediato. “Pode até refletir nos preços de alimentos e bebidas, porque o custo do dinheiro fica mais caro para pessoas físicas e jurídicas”, afirmou.
Hugo Garbe lembra que o aumento dos juros também pressiona o orçamento das famílias, principalmente aquelas que já têm dívidas. “Com parcelas mais altas, sobra menos dinheiro para outros gastos, gerando uma perda de poder de compra. Esse efeito pode ser ainda mais severo em um cenário de inflação elevada”, disse.
Redução no consumo
Segundo o economista, com menos acesso a crédito e menor poder de compra, o consumo tende a cair, o que afeta diretamente o comércio e a produção industrial, contribuindo para uma desaceleração econômica. “É um ciclo em que o consumidor gasta menos, as empresas vendem menos, e a economia como um todo sente os efeitos”, disse.
A taxa de 10,75% ao ano valerá ao menos pelos próximos 45 dias (contados a partir do último dia 18), quando os diretores do BC voltam a se encontrar para discutir novamente a conjuntura econômica nacional.
Repasse é sentido de imediato?
A avaliação dos economistas é de que o repasse do aumento dos juros no dia a dia do brasileiro deve ocorrer no curto prazo.
O economista Fernando de Aquino, membro da comissão de política econômica do Cofecon (Conselho Federal de Economia), pondera que é preciso considerar a extensão do aumento para calcular a rapidez do impacto. Segundo ele, o crescimento de 0,25 ponto percentual da Selic é “bastante pequeno”, mas, caso o BC opte por um ciclo de alta nas próximas reuniões do Copom, o impacto virá mais rapidamente.
“A primeira coisa que precisamos considerar é a extensão do crescimento. Existe a perspectiva de, nas próximas reuniões, haver aumentos adicionais. Então, vai depender da magnitude e da quantidade das elevações para calcular o efeito final desse ciclo, se houver um ciclo de alta”, explicou.
Já Pagnussat avalia que o impacto é imediato para os consumidores e empresários, que terão juros mais altos em todas as linhas de financiamento com recursos livres. “Tem também outro impacto, ainda no curto prazo, que é o efeito de redução do crescimento da economia e do emprego”, afirmou.
Impacto é mais rápido quando a Selic tem alta ou quando cai?
Historicamente, segundo Hugo Garbe, o repasse do aumento dos juros para o consumidor acontece de forma mais rápida do que a redução das taxas. Isso ocorre porque, ao aumentar a Selic, o custo do dinheiro para os bancos sobe imediatamente, e as instituições financeiras ajustam suas taxas para empréstimos e financiamentos rapidamente para manter suas margens de lucro.
“Já no caso de uma redução dos juros, o repasse é mais lento. Os bancos e outras instituições financeiras tendem a segurar as reduções de taxa por mais tempo, aproveitando a diferença para melhorar seus lucros. Além disso, quando a Selic cai, os bancos podem estar mais reticentes em repassar a queda imediatamente, seja por incerteza econômica ou pela necessidade de compensar eventuais perdas anteriores”, explicou.
E os investimentos? Como ficam?
O coordenador da graduação em mercado financeiro e de capitais e de ciências econômicas do Centro Universitário IESB, Riezo Almeida, explica que, para os investidores no curto prazo, a renda fixa aumenta um pouco. “A expectativa do mercado é de que a taxa continue subindo até atingir 11,5% ao ano até janeiro, com isso o maior beneficio está para o investidor de renda fixa. Isso porque produtos como o CDB, o RDC, a LCA e até a poupança têm como indexador a taxa Selic”, afirmou.
Já os investidores de renda variável, uma Selic alta tende a ser negativa para a renda variável (ações), pois o custo do crédito para empresas aumenta, afetando a capacidade de investimento e expansão dos negócios. “Além disso, os investidores podem preferir migrar para a renda fixa, que passa a oferecer rendimentos mais atraentes e seguros”, completou.
Fonte: R7