O desejo de formar uma família por meio da adoção sempre esteve no coração de Débora e Paulo*. Desde que se casaram, em 2002, sonhavam em oferecer um lar para uma criança. Mesmo com a possibilidade de ter filhos biológicos, o casal escolheu esperar pelo momento certo, quando a decisão fosse, como Débora define, “muito genuína”.
Essa espera durou 13 anos. Foi apenas em 2015, já morando no interior de Rondônia, que deram o primeiro passo oficial: se habilitaram no Cadastro Nacional de Adoção, passaram pelos cursos obrigatórios, conversaram, refletiram e se prepararam, emocional e estruturalmente, para receber uma criança.
O caminho, no entanto, não foi simples. Morando em uma cidade pequena, as possibilidades surgiam, mas nem sempre os perfis se alinhavam. Até que, em 2020, no auge da pandemia, o telefone tocou — uma ligação que mudaria tudo.
Do outro lado da linha, uma assistente do Fórum de Sete Quedas (MS) informava que havia uma criança vinculada ao cadastro deles. Maria Clara, uma bebê de seis meses, havia sido encontrada sozinha na rua e enfrentava graves problemas de saúde, como hidrocefalia e malformação neurológica.
“Quando vi no visor ‘TJ – Sete Quedas’, meu coração bateu diferente. O mundo parecia desabar, meu sogro estava entubado com Covid. Mas, ao mesmo tempo, algo novo e muito forte nasceu em mim”, lembra Débora.
A ligação reabriu também uma ferida pessoal. Em 2019, Débora havia sofrido um aborto espontâneo de gêmeos. E o impacto foi ainda maior ao ouvir da psicóloga que Maria Clara era fruto de uma tentativa de aborto. “Aquilo mexeu muito comigo. Mas, ao invés de recuar, nasceu um amor que eu não consigo explicar.”
Amor que atravessa distâncias
O casal pediu alguns dias para refletir, mas a decisão parecia já estar tomada no coração. Uma busca rápida na internet trouxe a confirmação: uma notícia falava sobre uma bebê de seis meses, encontrada em Sete Quedas. O nome? Maria Clara, o mesmo que o abrigo havia dado. “Falei: é ela. Não pode ser outra.”
Vieram então as primeiras chamadas de vídeo e, depois, o tão esperado encontro presencial, seguindo todos os protocolos da pandemia. A convivência no abrigo foi intensa, cheia de amor, descobertas e certezas.
“Quando vi aquela menininha no colo da cuidadora, mamando, tão viva, tão lutadora… percebi que ela não era um diagnóstico, ela era vida, amor, nossa filha.”
O casal apresentou por videochamada o quarto que prepararam para Maria Clara, com papel de parede, berço feito pelo próprio pai e uma guirlanda com o nome dela na porta. Emoção que atravessou telas e corações.
Superação além do amor
Após os dias de convivência e a guarda provisória concedida, Maria Clara seguiu para Rondônia, onde a nova vida começava de fato. Pouco tempo depois, enfrentaram juntos um novo desafio: uma cirurgia urgente para colocação de uma válvula de derivação, essencial no tratamento da hidrocefalia.
Mesmo em meio às restrições da pandemia, com hospitais sobrecarregados e incertezas no ar, tudo deu certo. A rede de apoio, os profissionais de saúde e, principalmente, a força de uma família construída no amor, foram fundamentais.
Hoje, Maria Clara cresce rodeada de cuidado, amor e superação. E Débora faz questão de reforçar: “A adoção não é um ato de caridade. É sobre amor, é sobre se abrir para algo maior. Não foi só ela que ganhou uma família. Nós é que fomos presenteados com ela.”
O papel do Judiciário
A história de Débora, Paulo e Maria Clara reforça também o papel fundamental do Judiciário no processo de adoção. Desde a habilitação até a guarda definitiva, o acompanhamento da equipe técnica e as garantias legais são essenciais para assegurar que o processo seja feito com responsabilidade, segurança e, sobretudo, muito amor.
* Os nomes são fictícios para preservar a identidade dos envolvidos.