Você já ouviu falar em disania, terrir ou pejotização? Talvez ainda não, pois essas palavras ainda não fazem parte oficialmente do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP), documento que regulamenta a grafia das palavras do português brasileiro. Elas estão na “lista de espera” da Academia Brasileira de Letras (ABL), aguardando aprovação para serem incorporadas ao idioma.
O que são essas palavras?
- Disania: dificuldade extrema de sair da cama pela manhã, mesmo após uma noite de sono.
- Terrir: gênero de filme ou obra que mistura terror e humor.
- Pejotização: prática de contratar um trabalhador como pessoa jurídica (PJ).
Esses termos são exemplos do cotidiano contemporâneo, que refletem mudanças sociais, culturais e econômicas.
Como novas palavras entram no VOLP?
Diferente dos dicionários tradicionais, que registram o uso cotidiano, gírias e regionalismos, o VOLP tem uma função normativa: ele oficializa a grafia correta das palavras na norma culta do português brasileiro, mas não cria nem autoriza o uso delas — quem faz isso são os falantes.
Segundo Ricardo Cavalieri, coordenador da Comissão de Lexicografia da ABL, para uma palavra ser incorporada ao VOLP, ela precisa apresentar:
- Ocorrência em textos escritos, como reportagens, livros e artigos acadêmicos, não só na oralidade ou redes sociais;
- Presença em pelo menos três gêneros textuais diferentes, mostrando que o termo é usado em contextos variados e não restrito a um grupo;
- Uso estável e uniforme, sem variações de significado que causem confusão;
- Adaptação ortográfica, no caso de palavras estrangeiras, que devem ser aportuguesadas para entrar no vocabulário oficial.
Palavras na “sala de espera”
Além das três já citadas, outras também aguardam decisão, como:
- Cordonel (lona têxtil para conserto de pneus);
- Microssono (brevíssimo período involuntário de sono);
- Reclínio (ato de inclinar ou deitar-se);
- Retrofitagem (modernização de edifícios antigos sem alterar a estrutura);
- Tokenização (substituição de dados sensíveis por códigos seguros em tecnologia).
A aprovação depende do tempo e da análise da frequência e estabilidade do uso.
Novidades recentes aprovadas
Nos últimos anos, o VOLP incorporou termos ligados a movimentos sociais (como antirracista, sororidade e homoparental), tecnologia (streaming, criptomoeda), pandemia (covid-19, telemedicina) e outras áreas. A palavra covid-19 entrou rapidamente devido ao uso massivo global.
Por que surgem tantas novas palavras?
A língua é viva e reflete as transformações da sociedade. Avanços tecnológicos, mudanças culturais e necessidades sociais trazem constantemente novas realidades que precisam ser nomeadas.
Muitos termos estrangeiros são incorporados ao português, por empréstimo, e passam por adaptações. Por exemplo, “football” virou “futebol”, “delete” deu origem a “deletar” com sentidos próprios no português, e “point” ganhou um sentido específico no Brasil como “lugar badalado”.
Além disso, áreas técnicas como medicina e engenharia criam neologismos para novas descobertas e procedimentos — como “retrofitagem”, termo da arquitetura em análise atualmente.
O processo é democrático
“A força da língua está no uso das pessoas, não em decretos”, reforça o linguista Marcelo Módolo, da USP. Assim, o VOLP é uma ferramenta que acompanha a evolução da língua, mas são os falantes que criam e consolidam os termos no dia a dia.