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quinta-feira, 18 de abril, 2024
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Estudo aponta que núcleo da Terra desacelerou, e fenômeno pode afetar duração dos dias

Alterações de movimentação poderiam permitir a compreensão do papel exato do núcleo interno do planeta na manutenção do campo magnético

O núcleo da Terra parou de girar mais rápido do que o próprio planeta. É o que aponta um estudo feito a partir de dados de terremotos, realizado por Yi Yang e Xiaodong Song, sismólogos da Universidade de Pequim. O artigo científico foi publicado pela revista “Nature Geoscience”, e o resultado foi uma surpresa para os próprios autores. A dupla de pesquisadores estuda o fenômeno desde 1995.

De acordo com a pesquisa, essa desaceleração pode ter efeitos globais, como encurtar os dias em algumas frações de segundo e influenciar o clima e o nível do mar. Contudo, outros especialistas, que não participaram do estudo, sugerem que “nada cataclísmico está acontecendo”.

A Terra é formada pela crosta, pelo manto e pelos núcleos interno e externo. O núcleo interno sólido, com temperaturas similares às do Sol, está situado a mais de 5.000 quilômetros de profundidade e é separado do manto semi-sólido pelo núcleo externo líquido, que permite que o núcleo interno gire a uma velocidade diferente da rotação da própria Terra. Essa rotação é impulsionada pelo campo magnético gerado no núcleo externo e equilibrada pelos efeitos gravitacionais do manto.

Estudo aponta que núcleo da Terra desacelerou, e fenômeno pode afetar duração dos dias
 (Foto: Science Photo Library)

Conforme explicou o sismólogo do ON, Dr. Diogo Coelho, para entender o que acontece em áreas mais profundas do planeta, os cientistas normalmente analisam registros de grandes terremotos em várias estações sismográficas ao redor do mundo.

Mais precisamente, analisa-se o tempo de percurso das ondas sísmicas, ou seja, o intervalo de tempo necessário para que as ondas percorram a distância entre o hipocentro do terremoto (onde ele foi gerado) e o ponto da superfície onde ele é registrado. A variação no percurso das ondas sísmicas revela a composição interna do núcleo e sua taxa de rotação.

“Para investigar o núcleo interno, nós analisamos os registros dessas ondas sísmicas que passam através da sua estrutura, coletando informações sobre suas propriedades físicas que são registradas pelas estações sísmicas em forma de sismogramas”, completou a geofísica brasileira Thuany Costa de Lima, doutoranda em Sismologia na Universidade Nacional da Austrália.

Para o novo estudo, Song analisou quase 200 terremotos nas Ilhas Sandwich do Sul, um remoto arquipélago atlântico perto do Pólo Sul, ocorridos entre a década de 1960 e o presente.

Esses terremotos aconteceram em pares e produziram ondas idênticas. Mas quando foram captadas em estações de medição no Alasca, perto do Pólo Norte, suas ondas chegaram ligeiramente descompassadas, como se, ao passar pelo núcleo, o núcleo girasse mais rápido que a crosta.

A análise desses tremores com modelos de computador mostra que em 2009 o núcleo da Terra desacelerou e desde então tem girado um pouco mais devagar que a crosta.

“Visto do espaço, o núcleo gira quase na mesma velocidade que o resto do planeta. Mas do ponto de vista da superfície, onde estão as estações sísmicas, o núcleo agora está girando na direção oposta; para o oeste”, explica Song.

Este fenômeno, de acordo com Song, pode ter efeitos globais. “Nos últimos anos, os dias estão ficando mais curtos e é possível que isso se deva em parte ao núcleo da Terra.”

Segundo ele, graças à anomalia do núcleo, um dia é um milésimo de segundo mais curto agora do que em 1970.

No entanto, para Hrvoje Tkalčić, geofísico da Universidade Nacional Australiana e estudioso do núcleo terrestre – que não participou do estudo – a situação não é tão alarmante quanto aparenta ser:

“O núcleo interno não para completamente”, disse ele. A descoberta do estudo, segundo Tkalčić, “significa que o núcleo interno está agora mais sincronizado com o resto do planeta do que há uma década, quando girava um pouco mais rápido. Nada cataclísmico está acontecendo”, disse o geofísico.

Tkalčić, autor de “The Earth’s Inner Core: Revealed by Observational Seismology”, disse que a “análise de dados do estudo é sólida”, mas as descobertas “devem ser tomadas com cautela”, pois “são necessários mais dados e métodos inovadores para esclarecer esse problema interessante”.

Para a geofísica Thuany, orientanda de Tkalčić, os novos dados indicam que o núcleo interno da Terra está desacelerando, ou girando mais lentamente do que antes, mas não necessariamente parado:

“O núcleo apenas pode estar girando sincronizado com o resto do planeta. Essa variação existe como resultado de forças gravitacionais e eletromagnéticas que atuam como torque, influenciando a velocidade de rotação do núcleo com o tempo”, destacou. “Se a rotação pode inverter? Esse é um tema de debate científico. Mais dados e métodos são necessários para discutir.”

Por fim, a especialista ressaltou que sabemos pouco a respeito do que acontece no núcleo interno porque essa é uma parte profunda e pequena do nosso planeta (menos de 1% do volume da Terra). Portanto, estudar o núcleo interno é uma tarefa desafiadora para os sismólogos.

“Apesar de pequeno em comparação com o resto do planeta, o núcleo interno tem papel fundamental para geração do campo magnético que nos protege dos raios cósmicos”, acrescentou. 

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