A tentativa de criar um programa para internação involuntária de dependentes químicos em Campo Grande foi barrada pela prefeita Adriane Lopes (PP). Isso porque o Projeto de Lei 11.792/25, aprovado pelos vereadores no dia 24 de abril, teve a sanção vetada, conforme publicação no Diário Oficial do Município (Diogrande) desta terça-feira (20).
Na justificativa, a prefeita pontuou que tema tratado na matéria é de competência exclusiva da União, além disso, houve pareceres técnicos contrários emitidos pelas secretarias municipais de Saúde (Sesau) e de Assistência Social. A PGM (Procuradoria-Geral do Município) apontou vícios de inconstitucionalidade e ilegalidade.
Segundo consta, o PL regulamenta temas que já tratados na Lei Federal 13.840/2019, que estabelece critérios rigorosos para a internação involuntária, como avaliação médica fundamentada, comunicação obrigatória ao Ministério Público e à Defensoria Pública, além da obrigatoriedade de que o tratamento ocorra em unidades de saúde multidisciplinar.
No entendimento da PGM, o Projeto aprovado pela Câmara Municipal não respeita essas diretrizes, o que compromete sua legalidade. Também foi identificada ausência de análise de mérito ou legalidade por parte da Procuradoria da Câmara Municipal, contrariando o artigo 148 do Regimento Interno da Casa de Leis.
A justificativa da prefeita para o veto também mencionou uma Nota Técnica Conjunta elaborada pela Defensoria Pública do Estado, Defensoria Pública da União e Ministério Público Federal, alertando para a inconstitucionalidade da proposta e seus riscos à proteção dos direitos humanos.
Já a Sesau sustentou ser contra o PL por afastar das diretrizes da Reforma Psiquiátrica, da política nacional sobre drogas e da lógica do cuidado em liberdade defendida pelo SUS (Sistema Único de Saúde). Ainda no parecer, classificou a proposta como um retrocesso, ao reforçar práticas excludentes e ineficazes, já superadas pela legislação atual.
A SAS, por sua vez, criticou a falta de clareza quanto à modalidade de tratamento proposta e à forma de regulação das internações e alertou para os riscos da adoção indiscriminada de Comunidades Terapêuticas, mas que enfrenta críticas por práticas semelhantes às do modelo manicomial, extinto pela Lei da Reforma Psiquiátrica (Lei nº 10.216/2001).
Entenda a proposta
Na prática, o Projeto de Lei criava em Campo Grande o Programa Municipal de Atendimento, Recuperação e Encaminhamento de Dependentes Químicos para promover ações integradas de acolhimento, tratamento, reinserção social e encaminhamento assistido de pessoas em situação de dependência de substâncias entorpecentes ou psicoativas.
Entre as diretrizes estabelecidas na matéria, estão o atendimento humanitário, interdisciplinar e intersetorial; apoio psicossocial e orientação às famílias; promoção de campanhas educativas e preventivas sobre os riscos do uso de drogas e álcool e o incentivo à capacitação profissional e programas de reinserção no mercado de trabalho.
A proposta ainda cita que o Município poderá estabelecer parcerias com clínicas especializadas, comunidades terapêuticas e instituições públicas ou privadas de saúde e criar e/ou ampliar os Centros Municipais de Acolhimento e Tratamento, conforme disponibilidade orçamentária, para oferecer suporte médico, psicológico e social.
O texto autoriza a condução involuntária dos dependentes para avaliação médica em casos em que haja indícios de comprometimento da lucidez. Essa condução deverá ser feita por uma equipe da assistência social, com profissionais de saúde e, quando necessário, agentes de segurança pública.
“A avaliação médica deverá ocorrer em unidade de acolhimento especializada, que será responsável por decidir, com base em laudo médico fundamentado, pela necessidade de manutenção da internação voluntária ou involuntária, conforme a legislação vigente sobre saúde mental”, cita um trecho do PL.
A proposta autoriza a internação involuntária dos dependentes durante operações policiais, desde que sejam identificados com sinais evidentes de comprometimento psíquico ou ausência de discernimento e também quando houver denúncia dos familiares e vizinhos, indicando comportamento de risco, abandono e risco à integridade de terceiros.
A PL foi apresentada pelo vereador Rafael Tavares (PL) e conta com a assinatura de Beto Avelar (PP), Veterinário Francisco (União Brasil), Herculando Borges (REP), Ana Portela (PL), Fábio Rocha (União Brasil), Landmark (PT) e Maicon Nogueira (PP). Agora, o veto será discutido no plenário pelos parlamentares para saber se derrubam ou mantém.