O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta quarta-feira (4) o julgamento que discute a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet. A análise é considerada decisiva para definir se as plataformas digitais, como redes sociais e provedores de internet, podem ser responsabilizadas por conteúdos criminosos postados por usuários.
Atualmente, o artigo 19 do Marco Civil estabelece que as plataformas só podem ser responsabilizadas judicialmente após o descumprimento de uma ordem específica que determine a remoção de conteúdos ilegais. Sem essa decisão, as empresas não respondem por eventuais danos causados por postagens de terceiros.
O julgamento tem repercussão geral (Tema 987) e ocorre no âmbito de dois processos. O primeiro, relatado pelo ministro Dias Toffoli, envolve um recurso do Facebook contra uma decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que ordenou a retirada de um perfil falso. O segundo, relatado pelo ministro Luiz Fux, trata de um recurso do Google que tenta reverter uma condenação do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que determinou o pagamento de indenização por danos morais pela manutenção de uma comunidade ofensiva no extinto Orkut. Em ambos os casos, os ministros relatores votaram contra os recursos das big techs.
Na última sessão, realizada em 18 de dezembro do ano passado, o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, votou contra o provimento dos recursos, mas propôs um modelo intermediário. Ele sugeriu três hipóteses para a remoção de conteúdos: por ordem judicial, por notificação extrajudicial e por um dever geral de cuidado das plataformas sobre o que é publicado.
O julgamento foi interrompido após um pedido de vista do ministro André Mendonça e agora volta à pauta. A expectativa é alta, uma vez que dois ministros — Dias Toffoli e Luiz Fux — já se posicionaram a favor de ampliar a responsabilidade das plataformas.
Nesta semana, o ministro Gilmar Mendes comentou que o julgamento pode representar “um esboço de regulação da mídia social” no Brasil. A discussão também repercutiu no meio político. Ontem, em entrevista coletiva, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) defendeu uma regulamentação urgente das redes sociais. “Temos que fazer uma regulamentação, seja pelo Congresso ou Suprema Corte, o mais rápido possível. Porque não é possível que um cara tenta dar golpe de Estado em 8 de janeiro e fale que isso é liberdade de expressão. Vocês sabem a fábrica de mentira desse país”, afirmou.
As empresas de tecnologia acompanham com preocupação a decisão. Em nota, o Google defendeu que o atual modelo deve ser aprimorado, mas sem abolir as regras que separam a responsabilidade civil das plataformas e dos usuários. “Abolir essas regras não contribuirá para o fim da circulação de conteúdos indesejados na internet”, afirmou a empresa.
O Google também destacou que já remove, de forma ampla, conteúdos que violam as regras internas de suas plataformas, contabilizando centenas de milhões de remoções por ano. A empresa defende que eventuais mudanças no Marco Civil garantam segurança jurídica e evitem remoções arbitrárias.
A decisão do STF deve gerar efeitos para todos os casos semelhantes no país e pode redefinir o papel das plataformas digitais na moderação de conteúdos no Brasil.