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sexta-feira, 26 de abril, 2024
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Manutenção de respiradores pelo Senai permitiu abertura de 9 UTIs no Estado e salvou muitas vidas

Quando a fisioterapeuta do Hospital Regional de Mato Grosso do Sul parou ao lado do leito de Edgard das Neves para dizer que ele já poderia respirar sem ajuda de um respirador hospitalar, a informação, em vez de vez de causar alívio e alegria, trouxe medo e apreensão ao cinegrafista que havia ficado internado numa UTI (Unidade de Terapia Intensiva) por 22 dias e outros 14 dias numa enfermaria. “Eu tive medo, porque não sabia mais se conseguiria respirar sozinho. Esse aparelho salvou minha vida e foi fundamental para a minha recuperação”, recorda.

Aos 55 anos, Edgard das Neves foi um dos 26.003 pacientes diagnosticados com Covid-19 em Mato Grosso do Sul e que evoluiu para um quadro grave, necessitando de cuidados intensivos. Os primeiros sinais da doença foram dores no corpo, diarreia e febre, mas em cerca de quatro dias os sintomas se agravaram e ele começou a sentir falta de ar. “Eu respirava e o ar não vinha. A sensação é de puxar, puxar o ar, mas como se seu nariz e sua boca estivessem trancados e não fosse possível passar nada. É desesperador”.

Assim que começou a respirar com dificuldade, ele correu em busca de atendimento médico e, ao chegar à Upa próxima à sua casa, já desmaiou. “Foi o que me salvou, porque viram que eu estava realmente mal e me transferiram imediatamente para o hospital”. No Hospital Regional, Edgard ficou poucos dias na ala amarela, destinada a pacientes em situação urgente, mas pouco tempo depois, que ele não sabe precisar com certeza, um dos médicos avisou que ele precisaria ser entubado.

“É uma sensação de desespero. Eu estava lúdico e completamente consciente. Naquele momento, pensava que se fosse entubado, dificilmente acordaria novamente. Tive muito medo, disse isso para o médico e ele me explicou que seria um procedimento necessário para que o tratamento pudesse ser eficaz e eu pudesse respirar melhor, então concordei e imediatamente apaguei”, recorda.

 Foram 22 dias sob fortes sedativos e só então Edgard se lembra de abrir os olhos. Durante todo esse tempo entubado, ele precisou respirar com ajuda de aparelhos e, mesmo depois de sair da UTI e continuar o tratamento na enfermaria do hospital, a respiração ainda era garantida por um respirador.

 “Foi por isso que eu fiquei com tanto medo de tirar depois. Foram mais de 30 dias respirando com aparelho. Eu queria me livrar daquilo, até porque sabia que outros pacientes precisavam daquele mesmo equipamento para conseguir sobreviver, mas a gente tem muito receio. Graças a Deus, aos poucos fui conseguindo respirar, mas ainda saí do hospital muito fragilizado e precisei de acompanhamento de fonoaudiólogo e fisioterapeuta por quase três meses”, revela.

Ação conjunta

O respirador hospitalar utilizado por Edgard é apenas um dos oito equipamentos que se encontravam estragados no Hospital Regional e foram consertados por técnicos do Senai de Mato Grosso do Sul numa ação conjunta entre Fiems, Governo do Estado e Energisa como forma de ajudar no combate à pandemia do coronavírus e que até agora já matou 404 pessoas em todo o Estado.

 Na avaliação do nefrologista Fernando Goldoni, que atua na linha de frente no combate à Covid-19 no Hospital Regional, um respirador é hoje um equipamento essencial no tratamento da doença. “O pulmão dos pacientes costuma ficar muito comprometido, então o respirador é fundamental para ajuda-los a respirar nesse período”, ressalta.

“Uma UTI conta com 10 leitos completos, então podemos dizer que o trabalho do Senai de manutenção de respiradores permitiu que abríssemos quase uma nova UTI aqui no hospital. Cada paciente grave de Covid-19 utiliza o equipamento em média por 10 dias, então a cada 10 dias são 8 pessoas com mais chances de serem salvas”, destaca a neurologista Aline Aline Mizuta Kozoroski Kanashiro, uma das médicas que atuam na linha de frente no combate à Covid no Hospital Regional.

Partindo dessa informação, é possível dizer que o trabalho do Senai permitiu a reabertura de quase nove UTIs em todo o Estado. Isso porque até agora já foram consertados 89 respiradores hospitalares de 124 que se encontravam estragados, garantindo uma melhor estrutura para atendimento de pacientes com Covid-19 em 18 municípios. 

Segundo a Secretaria Estadual de Saúde, antes da pandemia, Mato Grosso do Sul tinha 990 respiradores, número que saltou para 1.904 com ações do Governo do Estado e também com a solidariedade de empresas, que se disponibilizaram a doar nos equipamentos, e instituições, como o Senai, que colocaram suas equipes para atuar na manutenção dos aparelhos estragados.

“Ficamos muito felizes por essa parceria porque o Senai é uma instituição referência em manutenção de equipamentos, com um corpo técnico de alto nível, e colocou toda a sua estrutura à disposição para auxiliar na manutenção desses equipamentos que são de extrema importância para os nossos pacientes”, salientou o secretário estadual de Saúde, Geraldo Rezende, reforçando que o momento é de união entre todos os setores da sociedade.

Estrutura adaptada

A iniciativa do Senai de Mato Grosso do Sul faz parte de uma ação integrada dos Departamentos Regionais do Senai de todo o País. Desde o início da pandemia no Brasil, foram recebidos para conserto 3.919 ventiladores pulmonares, dos quais 1.082 estão em manutenção, 178 em calibração e 1.850 já foram devolvidos aos hospitais de 460 municípios de todos os Estados.

“A iniciativa de manutenção dos respiradores hospitalares tem sido muito bem sucedida, pois houve o engajamento efetivo de todos os parceiros do Senai nessa ação. Estão todos de parabéns”, avalia o diretor-geral da instituição, Rafael Lucchesi. “O número de equipamentos enviados pelos hospitais foi muito positivo, e esperamos receber o maior número de aparelhos que estão parados no País. A rede voluntária continuará trabalhando até que a pandemia de coronavírus esteja sob controle”, completa.

Em Mato Grosso do Sul, o Senai adaptou uma estrutura composta por unidades móveis para que o trabalho de manutenção fosse possível de forma segura para todos os colaboradores. Para isso, houve uma separação entre espaços destinados ao recebimento dos respiradores e também para higienização dos equipamentos. Só depois é que eles eram encaminhados para a manutenção.

O apoio da Energisa nessa ação também foi fundamental no trabalho de logística, buscando os respiradores estragados nos municípios e levando até à oficina adaptada do Senai, localizada em Campo Grande. A concessionária de energia ainda ajudou nos custos do processo de calibração dos equipamentos, etapa essencial para que eles pudessem ser devolvidos aos hospitais em plena condição de uso.

“Decidimos contribuir no combate à pandemia com o transporte e calibração dos respiradores para diminuir a curva de infecção do vírus no nosso estado. À medida que os números crescem, percebemos o quanto esses equipamentos são essenciais no tratamento dos casos mais graves que chegam nos hospitais. E além disso, adotamos várias outras iniciativas para amenizar o impacto da pandemia em Mato Grosso do Sul”, afirmou o diretor-presidente da Energisa MS, Marcelo Vinhaes.

Equipe multidisciplinar

Ao todo, foram investidos na operação R$ 501.462,68, sendo R$ 100.320 contrapartida da Energisa. Segundo o presidente da Fiems, Sérgio Longen, o Senai já tem uma expertise de mais de 70 anos na área de manutenção e esse é o momento de colocar suas capacidades à disposição para ajudar no combate a essa crise. “A instituição está se mobilizando, assim como as outras Casas que integram o Sistema Indústria, para dar uma resposta a essa crise. Entendo que esse é o momento de não medirmos esforços para encontrar soluções para ajudar no enfrentamento ao novo coronavírus”, afirmou.

O diretor-regional do Senai, Rodolpho Caesar Mangialado, destacou que houve uma espécie de seleção na própria equipe, para identificar quais eram os colaboradores com mais experiência na manutenção de máquinas industriais e até quem já havia tido contato com equipamentos hospitalares.

Assim foi montada uma equipe que reuniu engenheiros, administradores e instrutores, que dividiram o trabalho conforme a experiência de cada um e envolveu desde a produção de EPIs (Equipamentos de Proteção Individual), como máscaras e aventais, passando pelo recebimento, triagem, higienização, reparo, calibração e testes dos equipamentos.

“Eu sempre disse que o fundamental era nos empenharmos o máximo possível. Se conseguíssemos recuperar apenas um, dos 112 estragados que havíamos recebido, já era um feito importante, porque conseguiríamos salvar uma vida e isso já valeria todo o esforço. Conseguindo reparar 87, ficamos ainda mais felizes, porque são mais e mais vidas tendo uma chance maior de vencer essa doença, sem falar no legado, porque esses respiradores poderão ser usados depois da pandemia para pacientes com outras enfermidades”, declara o diretor-regional do Senai, Rodolpho Mangialardo.

Mesmo sabendo da importância da ação, a instrutora da área do vestuário do Senai de Campo Grande, Luane Sales de Oliveira, nunca imaginou que seu trabalho de produção de máscaras para os técnicos que atuavam diretamente com os respiradores teria impacto na hora de salvar vidas. “Eu sabia que as máscaras eram importantes, até no dia a dia, para evitar o contágio do coronavírus, mas é gratificante saber que de longe, fazendo apenas o que eu sei fazer e que é tão simples, eu pude salvar pelo menos uma vida”, comenta.

Na mesma linha, o engenheiro mecânico Jeancarlos Lucietto colocou seus conhecimentos à disposição da manutenção de respiradores de forma automática. “Inicialmente, foi como fazer qualquer outro trabalho, que precisa de dedicação e empenho. Só depois que me dei conta de que é um trabalho que faz toda a diferença, porque diferente de melhorar a produtividade de uma empresa, que também é importante, essa manutenção de respiradores hospitalares ajuda a salvar vidas. Quando a ficha caiu, me senti ainda mais motivado”, destacou.

Ajuda vontutária

Além dos colaboradores do Senai, a equipe de manutenção dos respiradores hospitalares contou com um reforço de fora da instituição. Voluntários que viram na iniciativa de reparo de equipamentos uma oportunidade de colocar seus conhecimentos à disposição para salvar outras vidas.

É o caso da engenheira eletricista Ana Maria da Silva, que não pensou duas vezes na hora de bater à porta do Senai para colaborar com o que fosse necessário. “Minha mãe ficou doente no fim de 2019 e precisou de um respirador. Não tinha nada a ver com a pandemia, mas ali eu entendi a importância daquele equipamento. Quando soube que o Senai estava trabalhando com isso, eu me disponibilizei a vir ajudar com meus conhecimentos na área e participei do reparo e dos testes dos equipamentos recuperados”, explic

Foi também depois de viver uma experiência semelhante que o engenheiro-mecânico e agente fiscal da Iagro, Júlio Nazar, decidiu se voluntariar para auxiliar na manutenção dos respiradores. “Tive um problema respiratório em 2015 e até hoje não sei o que foi, mas precisei ser entubado e sei qual é o sentimento de faltar ar e precisar de um respirador. Para que ninguém passe pelo que eu passei, eu quis ajudar como voluntário, alternando meus horários de trabalho na Iagro e aqui no Senai. Saber que a gente pode salvar a vida de uma pessoa é uma sensação muito gratificante e faz valer a pena colocarmos nosso tempo aqui”, finaliza.

Ascom

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