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sexta-feira, 29 de março, 2024
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MPT afirma que ‘obrigação de contratar aprendizes’ deve ser estendida a condomínios residenciais

Instituição argumenta que condomínio está enquadrado na definição de estabelecimentos e que apenas entidade sem fins lucrativos, que tenha por objetivo a educação profissional, fica isenta de observância da cota mínima 

   

O Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região (TRT-24) admitiu recurso de revista interposto pelo Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul (MPT-MS), para que o Green Park Residence, condomínio residencial localizado no Município de Naviraí, não seja excluído da obrigação de contratar a cota mínima de aprendizes.

O desembargador federal do Trabalho Nicanor de Araujo Lima recebeu o recurso por reconhecer divergência jurisprudencial quanto à interpretação do artigo 429, caput, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Pelo dispositivo normativo, estabelecimentos de qualquer natureza estão obrigados a reservar entre 5% e 15% de suas vagas, cujas funções demandem formação profissional, para alocação de aprendizes. Agora, o recurso deverá ser remetido ao Tribunal Superior do Trabalho (TST), que poderá reformar acórdão do TRT-24 e acatar os pleitos iniciais do Ministério Público.


A decisão foi dada no bojo de ação civil pública movida pelo MPT com o objetivo de que o condomínio cumprisse a cota legal de aprendizes. Inicialmente, o juízo de primeira instância negou pedido liminar feito pelo MPT ao entender que, por tratar-se de associação de moradores, não haveria obrigação de cumprir a lei. Diante da decisão desfavorável, a instituição interpôs recurso ordinário que resultou em novo acórdão conservando a sentença anterior. Amparado pelos fatos e fundamentos articulados nos autos, o MPT então requereu a apreciação do recurso de revista e seu regular processamento em Corte Superior.   
 
O procurador do Trabalho Jeferson Pereira recorreu ao TRT-24 defendendo que a CLT expressamente refuta a utilização de conceitos do direito comum para substituir norma específica trabalhista, o que não estaria ocorrendo no caso em debate. Isso porque há conceito próprio de estabelecimento regulando a matéria, consubstanciado pelo artigo 429, caput, da CLT, e artigo 51, §2º, do Decreto nº 9.579/2018.

“Vejo com uma grande vitória termos o conhecimento do recurso de revista e a sua subida ao TST. Esperamos, agora, reverter na instância máxima trabalhista o entendimento do tribunal da 24ª Região”, aponta o procurador.
 
O acórdão proferido pelo TRT-24ª Região aplicou o conceito de estabelecimento oriundo do direito comum, seguindo a definição do artigo 1.142 do Código Civil. Conforme esse entendimento, o condomínio edilício não se enquadra na definição de estabelecimento porque não tem finalidade econômica, sendo sua função primária cuidar dos interesses dos coproprietários.
 
Porém, em trechos do recurso de revista, o procurador Jeferson Pereira demonstrou a existência de divergência jurisprudencial que afasta a exclusão dos condomínios, mediante decisão proferida pelo TRT 2ª Região nos seguintes termos: “Vê-se que a legislação de regência é taxativa ao determinar o percentual de cargos dos estabelecimentos de qualquer natureza, cujas funções demandem formação profissional, que deve ser destinado à contratação de menores aprendizes, excetuando unicamente ‘entidade sem fins lucrativos, que tenha por objetivo a educação profissional’, aflorando cristalina a intenção do legislador de assegurar formação profissional aos jovens e adolescentes, em obséquio, inclusive, ao princípio da proteção integral do adolescente, estampado no artigo 227, caput, da CRFB”.
 
Entenda o caso
 
Antes de mover a ação civil pública, o MPT-MS buscou uma resolução extrajudicial para o conflito, por meio de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) prevendo que a Associação dos Moradores do Loteamento Fechado Green Park Residence cumprisse o dever legal de contratar aprendizes.
 
O acordo seria firmado em audiência administrativa proposta pelo procurador Jeferson Pereira, porém, a associação negou-se a participar do encontro, alegando “desconhecer” instituições de ensino que dispusessem de cursos profissionalizantes voltados às funções que são desempenhadas pelos funcionários/empregados” do condomínio.
 
Com a recusa, o procurador entrou com pedido liminar requerendo que a associação fosse impelida a contratar, ao menos, dois menores aprendizes, cumprindo assim a cota, além de efetuar o pagamento de R$ 50 mil a título de dano moral coletivo decorrente da conduta ilegal. O pleito previa, ainda, a reversão da multa ao Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Naviraí.
 
Nos autos, Jeferson Pereira narrou dois processos seletivos em curso no município no momento da ação civil pública – um aberto pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), voltado a serviços administrativos, e outro do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE), com qualificações nas áreas administrativa e de agronegócio.
 
Ao recorrer da decisão, o procurador ressaltou que estabelecimentos de qualquer natureza têm obrigação de empregar e matricular aprendizes, e que, segundo a Classificação Brasileira de Ocupações, as atividades de porteiros, vigias e afins, além de trabalhadores nos serviços de jardinagem, coleta de resíduos, de limpeza e conservação de áreas públicas, demandam habilitação profissional. Nesse sentido, condomínios residenciais devem cumprir o que está previsto na legislação.
 
Aprendizagem
 
O instituto da aprendizagem não beneficia apenas o aprendiz, mas a própria empresa que o matricula e o emprega, pois permite a formação de mão de obra qualificada, que poderá ser posteriormente absorvida por tempo indeterminado. Deste modo, a empresa ré, ao não contratar os jovens aprendizes a que está legalmente obrigada, viola frontalmente dispositivos de ordem constitucional, e, via de consequência, causa lesão aos direitos difusos e coletivos daqueles jovens trabalhadores que poderiam vir a ser admitidos como aprendizes, tendo garantido seu direito constitucional à profissionalização, e, no entanto, não o são em virtude da resistência de empresas em atender a cota legal de aprendizagem.
 
No Brasil, o trabalho é totalmente proibido antes dos 16 anos, salvo na condição de aprendiz a partir dos 14 anos. A Lei nº 10.097/2000 determina que estabelecimentos de qualquer natureza, com sete ou mais empregados, estão obrigados a reservar entre 5% e 15% de suas vagas, cujas funções demandem formação profissional, para alocação de aprendizes. Em microempresas e empresas de pequeno porte, a contratação de aprendizes é facultativa.
 
Para serem admitidos como aprendizes, os jovens devem ter entre 14 e 24 anos incompletos, exceto no caso das pessoas com deficiência, para as quais não se aplica o limite de idade. Também precisam estar cursando ou devem ter concluído o ensino fundamental ou médio. A lei determina ainda que a contratação será por prazo determinado de até dois anos – nas unidades educacionais de internação, a duração do curso precisa ser concomitante ao lapso temporal estabelecido para cumprimento da medida socioeducativa imposta.
 
Referente ao processo ACP 0024338-19.2019.5.24.0086
 
Assessoria de Comunicação

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